quinta-feira, 10 de novembro de 2016

A actuação do ICNF após o resgate de 9 de Janeiro na Serra do Gerês


O resgate levado a cabo no dia 9 de Janeiro de 2016 na Serra do Gerês e que muita tinta fez correr nos meios de comunicação social, mereceu por parte do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) uma actuação que irá parecer ajustada ao observador desconhecedor da situação e das regras do jogo no qual todos participam de uma forma ou de outra quando se percorre o nosso único Parque Nacional.

No entanto, tomando conhecimento das regras e analisando com a mínima atenção a actuação daquele instituto, algo faz soar os alarmes.

Não vou tecer aqui considerações acerca do relatório da Guarda Nacional Republicana e sobre as forças que se moveram para que ele fosse elaborado da forma como foi. De facto, toda aquela situação amplamente divulgada pela comunicação social teria de terminar com acusados e responsáveis pela deslocação de quase uma centena de operacionais e dezenas de veículos. Questiona-se também a actuação dos meios de alerta do socorro quando sabemos da chegada dos meios de comunicação social antes da chegada de determinados meios de resgate que, em última análise, deveriam ter sido os primeiros naquele palco.

Ora, toda aquela situação decorreu num ambiente de emergência. As condições meteorológicas eram extremas com ventos fortíssimos, intensa queda de chuva e granizo. Com o avançar das horas, a situação tornou-se mais complicada e o resgate terminou já noite dentro com a chegada à Portela do Homem a ser transmitida quase em directo pelas televisões... e pela CMTV.

O cenário era de quase caos com operacionais cansados e com montanhistas e resgatados exaustos. Naquela hora começou a formar-se uma trama que só teria resolução com o arquivamento de um processo inventado pelo ICNF que tinha como único objectivo arranjar bodes expiatórios que servissem que exemplo para as maralhas que se atrevem a desrespeitar a eminência de um Parque Nacional da Peneda-Gerês que, de facto, só existe no papel.

O processo desenrolou-se com a atribuição de culpa a três montanhistas que auxiliaram no resgate de três pessoas nas Minas dos Carris. Como é óbvio, todo este processo teve custos que ao longo dos meses nunca foram questionados, ao contrário dos custos do resgate que foram questionados de uma forma cega desde o início sem haver o mínimo de interesse em se saber se houve de facto necessidade para tamanho aparato.

No processo que então se desencadeou, o ICNF teve o cuidado de desenterrar leis com o único objectivo de punir os três montanhistas por negligência, mas não foi capaz de se lembrar que no Regulamento do Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês está lavrado o seguinte relativamente às disposições específicas das áreas de protecção total a que se refere o Artigo 12º, no seu Ponto 1):

Artigo 12º

1 - Nas áreas de protecção total a actividade humana só é permitida:

a) (...)
(...)
i) Situações de risco ou ocorrência de acidente grave ou catástrofe;
(...)

2 - Nas áreas de protecção total, estão sujeitas a autorização do ICNF, I.P., as actividades referidas nas alíneas a) a e) do número anterior.

Curiosamente, foi este mesmo artigo que foi utilizado em Outubro de 2016 para arquivar o processo e enterrar de vez este episódio lamentável.

Ao funcionalismo público exige-se a excelência de servir o país, não a ignorância sobre o trabalho que se faz. E a ignorância foi o que moveu o ICNF neste caso... ou terá sido?

Toda esta situação deve-nos fazer reflectir um pouco porque nada disto tem cabimento e basta fazer uma pequena pesquisa nas notícias que foram sendo publicadas na Internet sobre o assunto para se levantar algumas interrogações.

Note-se que a notificação do ICNF é feita tendo por base um relatório da GNR que supostamente relata uma subida na direcção às Minas dos Carris, quando na realidade os três montanhistas estavam a ajudar os bombeiros já na descida e solicitados por estes mesmo!

Resumindo, tudo isto me parece muito complicado e cheio de contradições, e mais intrigante fica quando ao ler o jornal GERESÃO, num artigo editorial de Miguel Dantas da Gama, é referido que estes jovens tinham autorização para fazer o percurso e utiliza esse argumento para justificar de certa forma o encerramento daquelas áreas à visitação! Ou Miguel Dantes da Gama foi mal informado ou nos quis atirar areia para os olhos. Será que este editorial é a ponta do iceberg que representa as pressões que foram feitas sobre a GNR para que fosse elaborado tal auto? Não houve aqui algum tipo de pressão para que estes jovens sejam punidos de qualquer das formas? A evocação da negligência nesse assunto chega a ser tão absurda que põe a nú a verdadeira intenção do ICNF! Isto é, punir a todo e qualquer custo, e levantar o máximo de poeira possível para encobrir uma actuação negligente e criminosa do próprio ICNF ao não informar devidamente aqueles que utilizam as suas áreas protegidas. Esta actuação arrasta-se, no caso das Minas dos Carris, desde os anos 80 quando chama a si o encerramento e os trabalhos de manutenção e segurança de toda a estrutura mineira abandonada desde os anos 70, não fazendo nada desde então.

Tal como em casos anteriores, o ICNF agiu como uma velha estrutura pouco oleada ao actuar de uma forma na qual nem se preocupou em escutar as vítimas deste processo, e actuando em base de um relatório possivelmente elaborado sobre pressão de uma casta ambientalista radical e extremista que tenta a todo o custo transformar o Parque Nacional da Peneda-Gerês como a sua própria coutada, ignorando milhares de anos de influência humana.

A preservação do PNPG faz-se educando e informando, não reprimindo e multando. Assim, e como muitos dos senhores do ICNF gostam de ser tratados por doutores e por engenheiros, ainda não desceram à Terra para assumir a ignóbil imbecilidade que fizeram e apresentar públicas desculpas pelo ocorrido!

Fotografia © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

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